Arturzinho
Artur, preparador físico do América de Natal, é uma figura que faz parte do patrimônio do clube: está na função há algumas décadas. Dono de um vozeirão impressionante, que teve seu volume amplificado a partir de um acidente que lhe afetou os tímpanos, passou a escutar menos e a falar (ainda) mais alto.
Tinha uma agenda de treinamentos imutável e não havia cristão que o fizesse abrir mão dela. Iniciava qualquer atividade (coletivo, recreação ou circuito training), sempre com 20 voltas de aquecimento em torno do gramado da Pousada, reduto americano.
Para os jogadores que estavam anos no clube, era desgastante; mas o choro não sensibilizava Artur porque, ganhando títulos, sua lógica prevalecia: não se mexe no que esta dando certo!
Era dotado, também, de uma paciência sem limites.
Eu era avesso às corridas de meia distância, e iniciava o trajeto de ida Pousada/Praia de Ponta Negra junto ao grupo. Na volta, convencia o goleiro juvenil Petrarca a me acompanhar num tranqüilo retorno, caminhando e conversando, bebendo água de coco, colhido a beira da estrada, até a demorada chegada no CT.
Arturzinho, pacientemente, sentado à sombra de uma árvore, cronometrava o tempo de cada jogador e esperava pelos retardatários goleiros. Todas as vezes que me aproximava de Artur, eu perguntava quanto tempo havia levado, e este respondia (em alto e bom som!): “Até 50 minutos, eu marquei!”.
Em seguida, comandava os 100 abdominais que encerravam as atividades do dia, enrolava o cordão do seu cronômetro no pulso, embarcava apenas de sunga e tênis no seu Chevette e ia embora, todo sorridente, com a certeza do dever cumprido!
Surdo...ou nem tanto.
Arturzinho nunca rasgou dinheiro e sua conhecida pão durice atravessava fronteiras. Quem mais o sacaneava era o doutor Maeterlink que não perdia uma oportunidade de tirar um sarro do colega.
No dia do acidente que afetou os tímpanos do Artur, Maeterlinck socorreu o colega, levando-o para o hospital.
Sentado ao lado de Artur (acomodado e deitado dentro da ambulância), Maeterlinck comentou com o enfermeiro acompanhante que finalmente as coisas estavam melhorando lá no América. Recebera um comunicado do presidente Jussier que na sexta-feira, o tradicional vale semanal seria substituído pelo pagamento do salário integral.
Para surpresa de todos, um inconsciente e quase surdo Arturzinho, abriu os olhos e perguntou pro Maeterlink:
“Doutor! A que horas é o pagamento?”.
2 comentários:
Grande Artur
Belos contos que nos envolvem a cada passada aqui em seu blog Valdir.
Já estamos acostumados e na expectativa de sempre ler suas postagens.
Parabéns.
Adalberto Day de Blumenau cientista social e pesquisador
Grande Valdir... digamos que a surdez de condução era seletiva...Tem uma expressão aqui no Nordeste que diz: "É cego! Mas bote uma nota de cem na frente dele pra ver se não enxerga!" Pois o Arthur era assim... seletivo. História genial.
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