sábado, 4 de junho de 2011

Técnico da Roça

Por Victor Kingma


Nunca em sua história, a modesta equipe do  Barreirão tinha ido tão longe numa competição: estava na  final da liga regional. Todos os habitantes da pequena cidade de Barreira se orgulhavam do feito e não se falava em outra coisa por toda a redondeza.  Tudo sob a batuta do folclórico técnico Modesto do Carmo, com seus métodos nada convencionais de transmitir suas orientações, muitas vezes com palavras impublicáveis.

Costumava dizer: meu nome é Modesto do Carmo!
Modesto eu posso até ser, mas Carmo não!
Se não seguirem minhas orde, fico nervoso mesmo...
E sorto as cachorras!...

   E este linguajar do seu técnico estava deixando sem sono toda a diretoria do Barreirão e até o prefeito local, pois, afinal, a partida seria transmitida pelo rádio para toda a região.     Zelosos pela imagem da cidade e preocupados com o que poderia falar nas entrevistas, resolvem substitui-lo, logo na grande decisão.   E contratam para seu lugar, um famoso técnico da capital, daqueles de paletó, gravata e fala empolada... 

E chega o grande dia.  Terminado o primeiro tempo, o Barreirão parece irreconhecível: 3 x 0 para os visitantes.   Atordoados, os jogadores não conseguem assimilar as orientações técnicas e variações táticas propostas pelo novo treinador.                             
Atendendo ao apelo desesperado da torcida que urrava pelo velho Modesto, o presidente do clube tenta a última cartada: - busca o homem!

E pela primeira vez na historia do futebol, um técnico foi substituído no intervalo...
E nosso herói, que assistia ao jogo da arquibancada, volta à cena, irrompendo pelo vestiário, já disparando suas máximas a torto e a direito:

- O time tá muito manso. Parece pardal de igreja!

- E o capitão, muito calado! Precisa bancar o cabrito entrando na faca: berrar o tempo todo!...   

- Zagueiro tem que jogar quiném pé de milho: plantado!

- E tem mais: atacante inimigo é feito cabeça de prego: tem que levar pancada, até sumir da sua frente!...

- Meio de campo não pode enrolar, tem que distribuir a bola igual a rabo de vaca: Prum lado e pro outro!...   

- A linha tá paradona! Esqueceu da tática do “tatu com porco?”:  É Cavar e fuçar o tempo todo!...

E arremata furibundo: - quando nóis tiver sendo atacado, arrecúa todo o time!...

E na hora do ataque, é quiném enterro de Coronel: vai  todo  mundo!...

Final do jogo: Em memorável  virada, o Barreirão vence o jogo por  4 x 3, com o nosso bravo Modesto do Carmo sendo carregado em triunfo, nos braços pela torcida...

Um pouco menos “Modesto” e mais “Carmo” que nunca.

Um comentário:

Adalberto Day disse...

Valdir
Modesto do Carmo, com sua calma conseguiu levantar a moral do Barreira.
Muito boa sua postagem, pois o Modesto podia ser modesto, mas como ele diz "carmo não", o trocadilho era muito bom para o Modesto modesto.
Essa de técnico ser substituído no intervalo, deve ir para o Guines.
As palavras simples que utilizava , é parte do cotidiano da maioria absoluta dos jogares, que vem de origens humildes.
Esse dia 4x3 foi o dia em que o Modesto deixou de ser modesto e ficou mais calmo.
Adalberto Day cientista social e pesquisador da história em Blumenau